No mês de agosto de 2020 escrevi um artigo para a Dolce Morumbi, na qual abordei a possibilidade da alteração das relações contratuais, por conta dos reflexos da pandemia do covid19. A situação financeira das empresas brasileiras, em razão da pandemia que estamos enfrentando, está sendo drasticamente afetada, tendo, como consequência, a redução da produção de bens, sua comercialização e o respectivo consumo. Isto infelizmente é público e notório. Nesse momento, ainda não é possível definir o tamanho do impacto na economia brasileira e mundial. Entretanto, é possível afirmar que as relações contratuais serão inevitavelmente atingidas, o que já começa a ocorrer. Há inúmeros contratos e/ou acordos que foram celebrados em determinada realidade econômica e, que estão sendo produzindo efeitos num cenário totalmente diferente.
É verdade que o contrato ou qualquer acordo obriga as partes, porém, essa regra não pode ser vista de forma absoluta, pois o panorama contratual atual é absolutamente diverso daquele, no qual a negociação fora firmada. Seguindo nessa linha e devido aos efeitos da pandemia, o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu liminares para substituir o Índice Geral de Preços – Mercado (IPG-M) pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) na correção do aluguel mensal, em contratos de locação. Isso ocorreu recentemente, em ações judiciais movidas por empresas locatárias contra o Shopping Iguatemi da capital de São Paulo. As empresas alegaram, em linhas gerais, a impossibilidade da utilização plena da loja locada, já que o shopping estava funcionando com a capacidade reduzida (40%) e apenas por 10 (dez) horas por dia, além de apontarem que a manutenção de suas atividades dependia da revisão do valor dos aluguéis.
Na decisão liminar o desembargador apontou que houve forte alta do IGP-M no último ano e os efeitos da pandemia persistem, trazendo um enorme prejuízo ao comércio.
Em outra decisão liminar, a desembargadora apontou que “vislumbra-se plausibilidade nas alegações, pois a crise sanitária decorrente da pandemia de COVID-19 atingiu o equilíbrio das obrigações contratuais. Assim, considerando o risco de inadimplência e a reversibilidade da medida, defiro a tutela recursal de urgência para determinar que o 13º aluguel seja calculado com base na média dos locativos pagos durante o ano de 2020; bem como para substituir o IGP-M pelo IPCA…”. É importante apontar que, na decisão liminar, também houve uma alteração no cálculo do 13º aluguel, geralmente exigido das empresas locatárias de shopping centers. Em resumo, trata-se de mais uma relação contratual firmada antes da pandemia do covid-19, que está sofrendo alterações por força da intervenção do Poder Judiciário.