As novas tecnologias são de extrema importância para o avanço da sociedade, mas, infelizmente, a velocidade com que os bandidos se aperfeiçoam para burlar os novos sistemas digitais é assustadora. Os magistrados da 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo, por decisão unânime, em sessão permanente e virtual, negaram provimento ao recurso interposto por uma instituição financeira, contra a sentença que julgou procedente os pedidos de uma empresa de móveis para determinar que o banco se abstenha de aplicar juros e multa sobre o cheque especial da conta corrente da empresa.
Os desembargadores mantiveram ainda a condenação à instituição financeira para estornar R$ 23.997,60 (vinte e três mil, novecentos e noventa e sete reais), além de pagar R$ 15.000,00 (quinze mil reais) por outros danos, em razão de uma brecha no aplicativo do banco, permitindo que golpistas furtassem dinheiro da conta da empresa de móveis. A defesa sustentou não existir falha na prestação do serviço bancário, tendo em vista que todas as transações feitas por aplicativo requerem cadastramento de senha, bem como confirmação e autorização, mediante chip constante no plástico, sendo esta uma tecnologia inviolável. Argumentou ainda a defesa que a empresa é devedora, não havendo o que se falar sobre abstenção em se aplicar juros e multa sobre o limite do cheque especial e muito menos o desbloqueio da conta corrente da empresa.
Ao final, requereu o provimento do recurso com a reforma da sentença e, subsidiariamente, pediu que fosse reduzida a condenação pelos danos para R$ 2.000,00 (dois mil reais), cassando inclusive a restituição dos valores.
De acordo com o processo, ao acessar a conta bancária da empresa de móveis, a mulher se deparou com o sistema informando sobre uma atualização e pedindo a senha novamente. Acreditando que se tratava de procedimento normal, ela então digitou a senha. Ao tentar acessar a conta bancária no dia seguinte, a fim de realizar um pagamento, a mulher não conseguiu, pois a conta havia sido bloqueada. Assim, ela foi até ao banco para saber o motivo do bloqueio da conta e foi informada que houve 12 transferências, no valor de R$ 1.998,80 (hum mil, novecentos e noventa e oito reais e oitenta centavos) para cada transação.
Diante
da grande surpresa, informou ao gerente que jamais havia realizado tais
transações e solicitou o estorno imediatamente. Entretanto, o gerente do banco
alegou que não poderia fazer tal procedimento, pois ela havia digitado a senha
contida no cartão de segurança. A empresa ainda ficou sujeita ao pagamento de
R$ 18.537,57, resultantes de juros e multa pela utilização do cheque especial.
No entender do relator do processo, o pedido de reparação de dano foi baseado
no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, que estabelece que o prestador de
serviços – neste caso, a instituição financeira – só não responde pelos danos
se provar que a culpa é exclusiva do consumidor ou terceiro, ou se provar que
não existe defeito no serviço prestado. Referido artigo, em seu “caput”, parágrafo terceiro e respectivos
incisos, assim dispõe: “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência
de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos
relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou
inadequadas sobre sua fruição e riscos. § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando
provar: I – que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II – a culpa
exclusiva do consumidor ou de terceiro”.
O magistrado citou que, comprovado que o prejuízo suportado pela empresa autora se deu em razão da obtenção de seus dados bancários de natureza sigilosa por golpistas, que se valeram da fragilidade na segurança do internet banking da instituição financeira, aplica-se a Súmula 479, do STJ, que assim dispõe: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”.
No processo restou demonstrado que foram realizadas 12 transferências bancárias, em consequência dos supostos atos fraudulentos de terceiros, desconhecidas pela empresa correntista. Para o magistrado, o banco limitou-se a sustentar que o evento seguiu todos os protocolos de segurança e se deu por culpa exclusiva da vítima, que teria fornecido a senha e a sequência numérica do “token”.
Na decisão colegiada foi apontado que a tese da defesa não é o suficiente para isentar o banco da responsabilidade pela fraude ocorrida, que responde pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias, somente podendo ser afastada tal responsabilidade em caso de inexistência do defeito, da prestação de serviço ou por culpa exclusiva do consumidor, situação não comprovada nos autos. Esse tipo de situação é muito comum e o consumidor deve ficar muito atento aos pedidos de digitação e fornecimento de senha (fonte – clipping da AASP).